A falta de profissionais de TI no mercado profissional brasileiro é um problema antigo. No entanto, a cada dia que passa, ele se torna mais urgente, com o potencial de impacto profissional e econômico exponencial. Isso porque a transformação digital já se tornou uma realidade comum às empresas e parte vital de sua sobrevivência no mercado.
De acordo com a Samba Digital, braço da Sambatech, que realizou uma pesquisa intitulada Transformação Digital no Brasil, para mapear o mercado de transformação digital, entender os seus principais desafios e coletar insights, 45,7% das empresas brasileiras já estão implementando estratégias de transformação digital, 30,5% dessas empresas estão desenvolvendo uma estratégia para esse fim e apenas 1,9% ainda não possuem planos para abraçar essa mudança.
A carência de profissionais para atender a essa demanda vai bem além de empresas pequenas ou microempresas.
Estima-se que atualmente tenhamos um déficit de 408 mil postos de trabalho, com perdas se acumulando na casa dos R$ 167 bilhões, de acordo com a Softex, uma organização social voltada ao fomento da área de TI.
Um dos principais fatores dessa falta de profissionais é o êxodo de profissionais para o exterior. Com a pandemia, a digitalização e a institucionalização do trabalho remoto, profissionais com mais experiência e que possuem conhecimento de outros idiomas passaram a ser desejados por empresas internacionais, o que criou um processo de êxodo em massa já nos primeiros meses da pandemia. Pouquíssimas empresas no Brasil conseguem competir com ofertas de trabalho remoto em outra moeda.
Se pararmos para buscar uma previsão de melhora desse cenário, tendemos a ver uma situação complicada. Ainda vamos ter um período grande de incerteza, mas ele pode mudar se houver uma mudança na forma como as empresas atuam sobre a formação de novos profissionais, na definição de um plano de carreira, na melhoria de condições de trabalho e no equilíbrio entre a vida profissional e pessoal.
Se a empresa tem um profissional sênior, atualmente, e não se preocupa em oferecer benefícios para manter essa pessoa no quadro de colaboradores, existe uma chance muito grande de ela perder esse profissional em breve.
É muito importante que seja discutido um plano de carreira, benefícios (que vão além dos confortos comuns, popularizados por uma visão que temos de empresas como a Google e a Meta, com salas de jogos, comidas e bebidas grátis etc.) e formação contínua. Isso ajuda os profissionais perceberem o investimento da empresa em suas carreiras, que devem ser longas naquela organização.
Além disso, um fator que tem se tornado importante é a proposta de redução de carga horária, que precisa deixar de ser vista como um custo e passar a ser vista como um investimento no profissional, em seu bem-estar e em sua vida pessoal. As pessoas são mais que seus empregos, e o mercado está começando a perceber e lutar por isso.
Outra mudança de perspectiva é que os profissionais de TI podem fazer muito mais pelas empresas do que atualmente elas demandam deles, simplesmente por descartarem características valiosas desses profissionais e por não estarem habituadas a olhar para eles de uma forma ultrapassada.
Os profissionais de tecnologia são seres criativos com capacidade de solucionar problemas de negócios, não só de TI. Quando o profissional é visto como algo a mais, ele se sente valorizado. Ele acaba promovendo a empresa, trabalhando nela com mais gana por resolver seus problemas, pois sente o retorno de seu investimento em originalidade, ideias e inovação, algo que vai além do trabalho.
Mais um fator que precisa ser levado em conta é que há uma necessidade de mudar a mentalidade das empresas na sua busca por talentos. Eles precisam abraçar os iniciantes, se propondo a transformar eles em profissionais melhores, sempre mantendo, claro, salários competitivos conforme eles se desenvolvem.
Outro aspecto que precisa ser abordado é da capacitação de profissionais que já estão no quadro de colaboradores da empresa. É uma ótima ideia capacitar profissionais “in-company”. A empresa investindo em formação também demonstra a mentalidade de dar oportunidades para o time atual.
Atualmente, existem vários “bootcamps” e empresas que focam na qualificação de profissionais em determinadas tecnologias, mas também é possível fazer algo internamente, obtendo experiência dos profissionais com mais tempo na área. Também é importante lembrar que nem sempre o plano de carreira para profissionais considerados como “contribuidores individuais” é progredir para um cargo de gerência, coisa que é comum na área de tecnologia.
Essa é uma mudança contínua e complexa que demanda muito do mercado, estruturalmente falando. Hoje é praticamente impossível contratar um profissional sênior aqui no Brasil e que fale mais de um idioma, principalmente porque essas pessoas estão sendo atraídas por empresas estrangeiras.
Para chegarmos a um cenário mais promissor, será necessário mais investimento governamental em tecnologia, formação e fomento para empresas de base tecnológica (startups).
Uma saída interessante é o investimento em programas focados na formação de profissionais diversos, abraçando as minorias, sobretudo as mais carentes e as que sofriam discriminação dentro dessa área.
Um time diverso acaba por identificar oportunidades de negócio e soluções de problemas diversos, pois possuem olhares diferentes e isso também contribui para o crescimento das empresas
*artigo escrito por Luís Leão, desenvolvedor evangelista da Twilio, empresa líder global de comunicação em nuvem.
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